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"Vida longa aos dias de sol!"

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

PATERNIDADE DISTRIBUÍDA


A sociedade tem desafiado os modelos formais de família, trabalho, religião, lei. Os formatos históricos são diretamente questionados ou simplesmente substituídos por novas estruturas. As funções materna e paterna, antes confundidas pela relação parental e hoje substituídas pelo exercício da função, parecem ameaçadas. Sem a vivência dos limites impostos pela lei, familiar ou institucional, será que as próximas gerações serão dominadas por individualistas, imobilizados no narcisismo?


Famílias sem mãe ou pai, relações abertas, pais ausentes, competição destrutiva entre casais, uniões constituídas sem o custo do compromisso, as relações tem produzido formatos muito distantes do outrora usual pai, mãe e filhos. As funções parecem misturadas, diminuídas ou até eliminadas. A liberdade, independência e o sucesso econômico profissional, de pais e mães, justificam socialmente, a formação de filhos de forma distante e não participativa.

Aparentemente é delegada à escola, de forma não negociada, a obrigação de definir os limites da lei. Não preparada e limitada pela patrulha dos pais e a obrigação mercadológica de manter clientes satisfeitos, ela também fracassa. Os pais clientes não querem aceitar questões dos filhos, que no fim, apontam para falhas nos seus próprios modelos e comprometem sua estrutura familiar sustentada por um equilíbrio instável.

No trabalho, a geração Y necessita de sofás coloridos, mesas de sinuca, horário flexível e tudo mais que disfarce o óbvio da relação mercantil presente ali. Técnicas motivacionais devem inflar egos narcisistas, caso contrário, tudo fica muito sério e é melhor trocar de emprego ou melhor, de diversão.

A religião há pouco bem definida, passa a estar distribuída em diversos modelos e crenças. Não há nem mesmo a necessidade de uma crença comum, é aceita ou mesmo estimulada, uma opção individual onde o sujeito cria seus próprios credos e dogmas individuais. Melhor assim, aceitar um modelo comum implica em renunciar a outros, que no fundo podem produzir frustrações desnecessárias a quem não quer ter parte, quando pensa que pode ter tudo.

A lei, ex-absoluta e inquestionável, é flexibilizada por técnicas jurídicas ou simplesmente ignorada. Parece sem sentido seguir regras definidas por terceiros, quando há tantas alternativas. Mais que isso, o desafio à lei traz prazer e a sensação que se pode ir ainda mais longe.

Ficam as limitações objetivas da vida: saúde, dinheiro, tempo, morte. Impostos arbitrariamente pela realidade, em um modelo narcisista, confundem-se com novas barreiras a serem transpostas. Sem perceber, a vida, de uma longa caminhada, se transforma em uma maratona de obstáculos. Dietas alternativas, exercícios freqüentes, smartphones, internet, stock-options, bônus agressivos, parecem ferramentas capazes de superar mais estes desafios, mas não há treinamento suficiente para completar uma corrida sem fim.

Os sinais parecem definitivos. Os espaços individuais crescem sem limites, cada vez maiores, mas aí, a física impõe seus limites. Dois corpos não ocupam o mesmo espaço. Egos também se esbarram, não se sobrepõem. A ameaça que vem do lado define restrições e aos poucos, a energia de expansão passa a ser de defesa, o crescimento dos laterais impede o avanço, pior, ameaça as conquistas.

A compressão termina por formar um corpo único de diversas camadas. Ausentes de uma regra comum, oferecida pela cultura, moral, religião ou lei, no limite, esta massa deveria se desordenar ou atingir o equilíbrio pelo encontro pouco provável de forças opostas de intensidade semelhante, mas não parece ser este o caso.

Disfarçada por nomenclaturas atuais, a lei parece ressurgir. Dogmas religiosos, tradições familiares e capítulos da lei são paulatinamente substituídos por consciência social, respeito ao meio ambiente, feminismo, politicamente correto ou quaisquer novos apelidos às restrições abandonadas, ou melhor, substituídas. Já aconteceu antes, a geração passante e seguinte têm a tentação de julgarem-se reciprocamente, com a impressão de algo está sendo perdido ou negado respectivamente. No entanto, quase que os limites naturalmente ressurgem com novas embalagens.

O clube social, igreja ou partido político, são substituídos pelo facebook, orkut, ou youtube. Regras ou preceitos religiosos transformam-se em linhas de conduta implícitas, muitas vezes mais severas que as impostos por religiosos xiitas. A privacidade e opinião individual estão expostas à patrulha viral via internet, um deslize e rapidamente a falha estará sujeita ao julgamento de muitos, às vezes milhares. Uma paternidade "beeeeeemmm" distribuída.

(Marcos Paim C. Fonteles, psicanalista)